domingo, 19 de junho de 2011

Esse carnaval valeu!

Bem, esse carnaval foi em Tiradentes. Esse valeu a pena. Sem chuva, sem porco, sem barro. Na foto, Zé Rural, de peruca verde e Gleides. Eu, de alto falante.

O CARNAVAL, O BARRO E O PORCO

É evidente que há histórias que morrerão conosco. Outras, a bem da alegria, devem ser compartilhadas, especialmente quando o protagonista é mais inusitado que a situação.
Quando menino, não me dava bem com carnaval. Na adolescência arrisquei-me na bateria do Bloco do Saco, de Barbacena.  Ali as pessoas se vestiam de sacos de armazém, aqueles que acondicionam arroz, açúcar, milho.  Eram doados ao bloco pelos comerciantes, desde que o folião pintasse no saco (do armazém) o nome do patrocinador.
O que eu gostava, mesmo, era de narrar e comentar, para a rádio, os desfiles das agremiações. Fui até jurado uma vez. Verdade que quase apanhei quando critiquei o acabamento das fantasias e quando me recusei a dar uma nota alta para uma escola que decantara as qualidades do governo militar, poucos anos após o término do tenebroso período.
Foi muito bom criar e manter um programa para a FM Sucesso que se chamava O QUE EU VOU DIZER EM CASA. Nele, narrávamos com encenação radiofônica as ocorrências que envolviam prisões, brigas e outras maluquices que só podem acontecer no carnaval. Verdade também que quase entramos em frias imensas, pois os participantes das histórias nem sempre gostavam de ouvir seus nomes aos quatro ventos. Outros até pagavam pra aparecer.
Carnaval é maluquice. Uma vez tive de cheirar um frango dentro de uma sacola encontrada por um amigo, que tinha bebido mais do que podia, para convencê-lo a não comer aquilo, estava podre.
De outra feita, misturei restos de bebida numa garrafa pet. Preparei para os parceiros do Bloco do Pijama, que viviam bicando na garrafa da gente. Ou seja, bebida boa pra mim e a garrafa pet para os outros. Lá pelas tantas, a garrafa de cachaça sumiu e a pet estava comigo.  No dia seguinte, as pessoas me contaram coisas que eu não me lembrava. A tirimbamba devia ter um efeito hipnótico melhor que o do dormonid. Pena que perdi a fórmula.
Mais uma do Bloco do Pijama. Cheguei cambaleando no centro. Bloco disperso, o caminhão de som da rádio desfilava. Os locutores me viram e me colocaram sobre o capô, anunciando minha deprimente presença. Só me lembro de ter escorregado e batido no chão como um saco de batata. Fui devolvido ao lugar por um monte de seguranças e segui sentado naquele capô fervendo. Escorreguei de novo e só me lembro de ter acordado em casa.
A maior esquisitice que vivi num carnaval ocorreu anos depois de já ter desistido de fazer programas de rádio, tocar na bateria, tomar pinga, julgar e narrar desfiles. Um momento de insanidade me invadiu com o convite para ir a Alto Rio Doce ver o carnaval, junto com Zé Rural e esposa, mais minha irmã e o marido.
- Você precisa ver o que é carnaval! Animação, gente jovem, bonita...
- Jura?!
- Claro, você não faz mais nada no carnaval, só fica em casa, vendo televisão.
- Melhor que me arrebentar.
- Você vai conosco. Lá tem uma fazenda, você vai descansar e ver um carnaval jovem, tranquilo, engraçado.
- Não sei.
- Você VAI. (Levaram-me pro jipe e nem conversa quiseram mais).
Sessenta quilômetros de estrada de terra e chegamos. Para não perder o costume, choveu. Sempre chove nas minhas histórias. E sempre chove muito no carnaval daquela região. Só que era uma chuva de verão, daquelas que caem de uma vez por vinte minutos.  
Andando pelo centro, vimos jovens se divertindo sadiamente, pulando em cima dos carros dos outros. Em frente à rodoviária um lago barrento servia de salão para os foliões que deviam ser uns dez mil espirrando água suja.
Resolvemos todos entrar na bagunça. Coloquei uma peruca de Elvis Presley (nunca mais ouvi falar nela depois), optei por me molhar de verdade ao invés de fugir das goteiras da rodoviária.
Depois de meia hora bufando por absoluta falta de preparo físico, implorei para me tirarem dali. Foi legal, adorei empurrar os outros pra sujeira, mas gostei menos quando me jogaram.
Entramos no jipe e fomos para a tal fazenda há uns três quilômetros. A chuva havia parado de vez, mas o que deixou de lama dava pra montar outro exército de guerreiros terracota de Xian. O jipe era daqueles tracionados, que sobem até parede, mas não subiu a anacôndica estrada para a fazenda, localizada nos píncaros da mais alta montanha daquelas plagas.
Em dias normais, aquilo é pó a granel. Em dias chuvosos, a lama chega a ter meio metro de profundidade, sem exagero. O dono da fazenda, que não era de muita conversa, avisou:
- O jipe num sobe não.
- Então vou voltar à cidade e pegar uns cavalos lá, falou o Zé Rural.
- Hoje nem cavalo sobe, “morreu” dois tentando, na chuva da semana passada.
- Então, como vamos? (eu perguntei)
- “De a pé”, uai. 
O último poste com lâmpada funcionando havia ficado há uns três quilômetros. Desci para inspecionar a situação. Quando saí do jipe, pensei que não havia chão. Afundei com tanta naturalidade que achei estava voando.  Como estava totalmente escuro, eles só foram me ajudar quando ouviram meu grito abafado e, mesmo assim, tive de continuar berrando para que achassem o local exato.
Depois de um deles afundar e ter sido resgatado pelo outro, que afundou logo em seguida até ser salvo pelo primeiro, fui puxado pelos dois e saí do buraco sem as botas, que ficaram sepultadas junto com os cavalos da semana anterior.
Não tive muita escolha de por onde ser puxado, motivo pelo qual fiquei sem os fundilhos da calça.
Voltamos abraçados para o jipe. Não pensem em boiolice, aquilo foi uma estratégia para não nos perdermos e para nos segurarmos em caso de escorregões.
Depois de uns três tombos, já dentro do jipe, traçamos a estratégia da caminhada para casa. Tinha de ser a pé, pois o jipe, para piorar as coisas, estava atolado. E parecia que ainda ia afundar mais.  Saímos. Três na frente, minha irmã, o marido e a esposa do Zé Rural.  Três atrás, eu, o Zé e o dono da fazenda.
Assim seguimos, enlaçados uns aos outros. Foi um tal de “ops, epa, cuidado, ui”, “plaft”. Entendi porque minha esposa não quis ir a esse passeio. Ela é bem mais esperta do que eu pensava.
E o rumo? Como saber para onde ir? Estaríamos indo ou voltando? Graças a um senso de direção incomum, o dono da fazenda parecia saber o que estava fazendo. Seguimos pelo absoluto breu, ora enfiando o pé num buraco, ora escorregando espetacularmente.
Após mais de uma hora subindo no escuro, aparece, como que por encanto, um riacho. Bem, era mais que isso, era quase um rio. Como pudemos enxergá-lo? A lua, por incrível que pareça, deu as caras por entre as nuvens.
O rio apareceu e com ele a pinguela, ou seja, aquela ponte na qual só se pode passar um e que, pra piorar, balança feito bambu. Até porque era feita de bambu. Ainda sob algum efeito da pinga que tomei, do afundamento, dos escorregões e de mais de uma hora em absoluta escuridão, não me senti na mínima condição de atravessar aquilo.
- Não vai me aguentar.
- Claro que vai, olha lá. O elefante passou e ela aguentou (Elefante era o Zé Rural que naquela época tinha uns 120 quilos).
- Eu sou mais pesado e ainda por cima estou meio tonto.
- Deixa disso, olha lá, sua irmã está indo.
- É porque ela enxerga mal e não está vendo o que faz.
- Olha, ela passou.
- Eu não passo, problema dela, prefiro ir pelo rio.
- É fundo aqui.
- Vou lá pra baixo onde deve ser mais raso.
- É, mas seguindo pra baixo tem uma plantação de arroz e uma cerca de arame farpado.
- Caramba, então eu atravesso, pronto, me seguro naquele corrimão ali (só naquele momento consegui ver que havia um corrimão na pinguela).
- Não, não pode segurar naquilo.
- Por quê? Regra da casa?
- Não, é que aquilo ali só enfeita, não aguenta peso nenhum.
- Então pra que existe um corrimão que não se pode correr a mão?
- Sei lá, não fui eu que o coloquei lá. (É, fazia sentido, mas poderia ter arrumado, pensei.)
- Vou pelo rio. Pronto.
- Olha, todos já foram. Você vai atravessar ou não?
- Vou nada. Ou é o rio ou durmo aqui mesmo.
- Olha ali. Tem só uns seis metros de altura. Se você cair, o tombo não é muito alto, tem água embaixo, amortece... tem pedras também, mas é mais fácil cair na água que na pedra.
Aquilo não me animou. Se fosse pra cair, o que tenho certeza que seria inevitável, melhor me jogar na água de uma vez.
- Vou pela água.
- Aqui é fundo, melhor então descer mais pra lá (apontou pra direita).
Segui por lá e ele, gente boa, veio atrás.
- Vou com você, vai que tem uma cobra aí.
- Tem nada, tá tudo molhado, cobra não gosta de água (não sei de onde tirei isso).
E lá fomos nós seguindo o leito do rio pela margem até dar de cara com uma cerca.
- Cerca? Atravessando um rio? Como pode?
- Não tá atravessando o rio. Ela acaba aqui e recomeça do outro lado. É divisa.
- Do quê? De Minas com São Paulo?
- Não, de fazendas. A gente passa pela cerca e sai do outro lado, desce mais um pouco, o rio fica mais raso, a gente atravessa na água pelas pedras e sai do outro lado, passa debaixo da cerca de novo e sai do meu lado. Daí a gente só tem de subir o morro e chegar lá em casa.
- Já estou cansado só de ouvir. Melhor ir fazendo isso aos poucos.
Claro que não foi simples para mim. A cerca era de fios muito próximos, então tive de deixar uns pedaços de roupa e de pele ali.  As meias também já tinham ido embora. E que frio. Entramos no rio. Água até a cintura e um frio sorvêtico, picolézico.
- Vai perto das pedras pra correnteza não te levar.
- Correnteza? Tem isso aqui?
- Uai, claro, já viu rio sem correnteza e sem cobra d’água?
- Cobra d’água?
- É, essa aí perto, mas fica tranquilo, ela não morde.
- Como você sabe? É sua conhecida?
Por que a lua resolveu aparecer? Pelo menos no escuro eu não estava vendo nada. Segui próximo às pedras com água até a cara, lembro-me de ter sido arrastado até mais perto de uma delas, na qual bati com o nariz, mas não fui arrastado. Saí do outro lado e lá estava o anfitrião me esperando. Rápido, ele.
- Me dá a mão que eu te puxo.
- Mais fácil você cair aqui tentando me puxar.
- Me dá a mão logo, anda. A cobra tá aí atrás de você.
Nem precisei da mão dele. Num átimo, lá estava eu de pé no barranco, prontinho para passar por baixo da cerca, ganhar o terreno dele e subir o morro em busca de um chuveiro quente que pudesse me ajudar a evitar a pneumonia até ali iminente.
Claro que deixei o resto da camisa na cerca, mais baixa que a anterior. Claro que me arrastei pela grama por alguns metros, até ter certeza que não havia mais arame farpado em cima de mim. A lua se foi outra vez e tudo foi escurecendo, mas subi valentemente o morro. De repente, vi uma lâmpada lá longe. Meus amigos, do tamanho de formigas, acenavam.
- Chegaram! Estão vivos!
Como um sobrevivente do ataque de Pearl Harbor, adentrei os portais do casarão, divisei um fogão à lenha com uma panela de sopa borbulhando. Aquele cheiro me deu forças para abraçar uma toalha, um sabonete, uma roupa limpa e um banheiro, onde tomei o banho mais reconfortante da minha vida, perdendo apenas para aquele que tomei depois de uma semana no pátio do exército tomando sol de graça.
Após o banho, recomposto da fisionomia de horror, tomei a sopa e me dirigi ao aposento. Morri ali mesmo e ressuscitei no dia seguinte, às cinco da manhã, ouvindo guinchos. Guinchos profundos e tristes, de um porco.  O que fazia um porco acordado e guinchando àquela hora? De ressaca e ainda com os músculos tremendo pelo esforço da véspera, abri a janela e vi.
Subindo o morro e já quase debaixo de minha janela, dois peões puxavam um porco enorme, que guinchava de dar dó. Achei que era pesadelo.
- Vamo levá ele pra lá.
- É, debaixo daquela jinela tá bão.
- Sossega, porco (e cacetada no pobre).
Eu não podia acreditar, mas eles iam matar um porco ali, cinco da manhã, naquele chão barrento, debaixo da janela do quarto onde eu tentava dormir.
- Ei, o que vocês vão fazer?
- Uai, homi. Num tá veno? Vamu matá esse porco.
- Mas é feriado...
- Pru sinhô, da cidade grandi... pra nóis num tem isso não... se quisé pode ficáveno...
Não tive outro jeito. Fiquei ali vendo o porcocídio. Um dos peões foi ao celeiro e pegou uma pá, com bosta de cavalo colada. O outro pegou um balde, despejou os ratinhos que moravam nele no chão e se dirigiu para a janela. O da pá tirou uma faca não sei de onde.
- Levanta o subaco dele aí.
- Tóim (barulho de facada no sovaco do porcão).
- Gui-gui-gui...(e a guinchação aumentou, sangue pra todo lado).
- Me dá esse sabugo aí.
- Toma.
O da pá pegou o sabugo de milho e arrolhou o buraco feito no sovaco do porco, que ainda guinchava. O porco, não o sovaco. Cheguei a pensar que ele tinha errado o coração da criatura, pois o que eu ouvia de guinchos era um espanto. Foi quando apareceu o Zé Rural no pátio pra ver o que se passava.
- Ah, matando porco...  mas desse jeito?
- Desse jeito como?
- O pobre tá cansado, subiu esse morro todo até aqui e vocês já enfiam a faca assim mesmo? Vai levar um ano pra morrer.
- Zé, nóis num tem um ano não, ele vai morrê é logo (deu umas cacetadas na cabeça da criatura - que maldade - até que o bicho sossegou).
Não vou negar. Ensaiei umas lágrimas. Fiquei pensando no dia que o pobrezinho nasceu (nem meu conhecido ele era), um leitãozinho cor-de-rosa pequenino, de nariz de tomada, todo mundo achando uma gracinha, a dona porca toda orgulhosa de seus vinte porquinhos... e agora ali, morto cruelmente. Não gostei nada daquilo.
- Vocês são uns covardes, gritei.
Ouvi um dos peões perguntar ao Zé Rural quem eu era e se era bom da cabeça. Pela resposta, cochichada no ouvido dele e pela risada que veio depois, boa coisa o Zé não disse a meu respeito.
Daí a pouco, colocaram o porcão em cima de uma tábua imunda e meteram fogo nele. Pensei: tanto trabalho e agora incendeiam a criatura? Não era um incêndio, era uma sapecada nos pelos. Logo um deles apareceu com um prestobarba. Foi tudo ficando branco.
Em seguida, eu já estava fora, vestido e totalmente esquecido da necessidade de dormir. Fui ver o resto da carnificina. Minha irmã e meu cunhado lá estavam, também dando vazão a seus instintos sádicos.  Além de nós, apareceram mais de cinquenta galinhas, todas esperando um pedaço de qualquer coisa.
Colocaram o porco de barriga pra cima, meteram uma picareta na barriga dele, rasgaram tudo. Colocaram o balde embaixo e, com a pá, encheram-no de tripas. Porco vazio, balde cheio.  Zé Rural começa a criticar a higiene.
- Olha a porqueira.
- Claro que é porqueira... não viu que eles mataram um porco?
- Não é isso, estou falando é dessa falta de higiene. Olha, uma pá colada de bosta de cavalo, um balde imundo, esse porco aí no chão enlameado, misericórdia. Se a vigilância sanitária baixar aqui acho que até nós teremos de pagar multa pra continuar vivendo.
- Que exagero. Isso é para consumo familiar mesmo.
- Uai, e família não tem de ter higiene?
- Eles vão fritar isso tudo e a sujeira desaparece.
- Anti-higiênico e pronto. Olha as galinhas. Todas bicando a barriga do porco. Olha aquela lá fugindo com um pedaço da vesícula dele.
- Ela vai se ferrar, aquilo é amargo, é bile...
- E galinha lá tem paladar?
Como se o show de horrores ainda não tivesse sido suficiente, entrou em cena um jumento. Os dois colocaram as bandas do porco, devidamente vazias, sapecadas e bicadas de galinha, em cima do pelo do lombo suado do pobre equino. E lá se foram, puxando o jumento carregado de porco.
- Inté, seu Zé Rural, inté seu homi duente. Fica cum Deus, que ele protege oceis.
Fiquei pensando que Deus era esse que iria me proteger, enviado por esses desalmados, que acordam um trabalhador de férias, em plena madrugada, assassinam fria e cruelmente um pobre ser de nariz de tomada, deixam uma sujeirada danada para chamar mosquitos que logo chegaram. E que ainda me chamam de doente. Coisa do Zé Rural.
No café da manhã, fiquei longe de presunto. Só pedi para voltar pra casa quando meu cunhado, após encher a barriga de queijo, fez uma sugestão iluminada ao dono da fazenda.
- Essa bela casa poderia ser transformada em um grande hotel, o que acha? Um hotel fazenda!
Nesse momento, minha irmã engasgou com um biscoito de polvilho, cuspindo tudo em cima de mim. O dono da casa olhou pra ele e, de forma simples, respondeu:
- Até dava, mas essa estrada é muito ruim...
Eu devia ter avisado para não darem queijo ao meu cunhado. Não me aguentei:
- Claro que poderia ser um hotel. Hotel de aventuras. Ele vai fazer um estacionamento para seiscentos helicópteros aqui. Afinal,  quem não tem um helicóptero hoje em dia? E ainda oferecer um tour à La Indiana Jones.
Carnaval é mesmo um período de maluquices. No ano seguinte, meus amigos voltaram à carga para me levar novamente para Alto Rio Doce.
- Ah, você precisa assistir o Bloco da Burrinha... é muito legal... ano passado nem pudemos ver!
No que eu respondi:
- Depois de tudo que eu passei, ainda vou de novo ver um bloco, ainda por cima chamado Bloco da Burrinha? Nem se eu fosse o burro do bloco eu iria. Prefiro ficar aqui, emburrado.
Agora, cá para nós.
Graças a Deus temos amigos que riem com a gente.
Que, mesmo diante das chatices nossas de cada dia, continuam nos convidando, pelo puro prazer de estar ao lado da gente.
Amigo não tem defeito. E ponto final.







segunda-feira, 13 de junho de 2011

Todo mundo vende o tempo todo

Verdade. Todo mundo vende. O tempo todo. Isso porque vender é convencer e persuadir alguém a aceitar que sua ideia, seus ideais e, por fim, seu produto ou serviço, podem atender à necessidade que seu interlocutor descobriu que tem, com ajuda de sua consultoria, seu relacionamento, a confiança e a ética que transparece com seu convívio. Por isso é certo dizer que todo mundo vende, vendeu ou venderá algo a alguém. O vendedor profissional deve ser um consultor que busca atender necessidades. E isso só é feito por quem gosta de gente, de ouvir, de falar e estudar profundamente clientes e produtos. Muita gente fala sobre isso e muitos fazem sem saber. O grande segredo está em analisar o próprio comportamento e dos outros. O resto é fechamento de venda. Boa sorte.

domingo, 12 de junho de 2011

O RÁDIO, O FUTEBOL E EU


Antes de trabalhar com vendas, fiz muitas coisas. Nunca fui do tipo prático, que conserta ou monta coisas. A última coisa que me meti a montar foi uma casa de passarinho para meu filho, que ficou parecendo um monte de lixo em cima de um cabo.
Com essa vocação para coisas práticas, a única coisa que aprendi foi pintar parede, lavar carro e colar. É, sei colar coisas que se espatifam, especialmente quando caem de minhas mãos estabanadas.
Tentei o teatro, mas as experiências foram mais ou menos, especialmente no campo financeiro. No palco, estereotipava os personagens quase estragando tudo em nome da irreverência. 
Depois de algumas peças, textos mal ajambrados e um curso de cinema em 1975, fui para o rádio.
Não consigo me esquecer dos quilômetros cansativos percorridos na escada de acesso à rádio. Nunca vivi um processo tão complicado, acho que não me queriam. Sei lá por que, talvez fosse muito novo,  talvez tivesse voz ruim.
Fui  locutor, redator, repórter, produtor e vi muita grana. Em sonho. Aproveitei  então o tempo para ouvir histórias, vivê-las e registrá-las.
Como essa.
Era um sábado cinzento e eu, estagiando, cheguei para ajudar em um programa de auditório sem auditório. Só que não havia programa. Locutor e técnicos estavam saindo para o estádio local para transmitir um amistoso entre o dono da casa e um time da terceira divisão do Rio de Janeiro. Fui junto.
Antes, passamos no centro para ver o time visitante ser fotografado em traje de gala. Chegamos e o estádio estava quase lotado. Fomos para a cabine (se é que aquele quadradinho de concreto era mesmo uma cabine).
Antes de qualquer coisa ser ligada, o locutor colocou seu imenso fone de ouvido, equipamento imprescindível para que todos soubessem que ele era o cara da rádio. Ou um marciano.
Era engraçado: ele berrava ao conversar conosco e nem tanto barulho havia assim. Descobri que ele ficava ouvindo a rádio, no fone, numa altura desesperada e, para falar, ele se esgoelava. Achava que só o ouviríamos se ele também se ouvisse. Enquanto isso, o técnico ajeitava as coisas por ali, tapando os ouvidos como podia.
Começa a peleja e o locutor começa a narrar. Narrar não é bem o que ele fazia. Digamos que ele zurrava.
- Bola com o jogador que é o... o... número 7 (aí procurava na lista) fulano! Opa, agora já tá com o jogador que é o... caramba, passa a bola pra alguém do time da casa, pelo menos assim eu sei no nome... E tome gritaria na narração. Eu tinha absoluta certeza que as pessoas do estádio poderiam ouvi-lo sem rádio. Acho que até na minha casa o rádio poderia ser dispensado e olhe que eu morava há uns dez quilômetros.  
Fala o comentarista, dizendo aquelas coisas que os comentaristas dizem, ou seja, nada. Fala o repórter de campo, bufando, pois havia corrido até o banco dos reservas em busca de uma palavra do técnico do imponente time visitante. Não entendi nada que ele perguntou. E olha que eu estava ali no meu ladinho, com meu ouvido colado num radinho de pilha. Ninguém como eu, anos depois, entendeu tanto os Titãs, com sua Sonífera Ilha, especialmente naquela parte de colar o ouvido num radinho de pilha numa ilha sonolenta. Aquele jogo estava me dando sono.
De repente, chuva. Normal, chuva em futebol é até legal. O campo não tinha uma drenagem boa, de forma que lagoas se formaram. De lagoas passaram a açudes. De açudes a uma grande represa. As arquibancadas não eram cobertas e o respeitável público começou a se molhar. A cidade já não é nenhum exemplo de lugar quente.
A chuva começou a apertar. Chovia baldes. A água batia na gente por atacado. Claro que não dava mais pra jogar, ninguém enxergava nada. O juiz suspendeu o jogo e tenho a impressão de que o apito só serviu para oficializar uma coisa que já tinha acontecido. Havia mais de meia hora que não se via jogador, bola, gandula, campo, nada.
Os únicos lugares aparentemente seguros ali, já que faíscas caíam como serpentinas junto a  caçambas d´água, eram as cabines das rádios. Cada uma das duas mal suportava quatro pessoas e as traquitanas eletrônicas valvuladas, naquele momento  já transformadas em sucata queimada. E a água entrava pela frente e pelos lados como cachoeira.
Milhares de torcedores entravam em qualquer coisa que tivesse uma cobertura e as cabines eram vistas como ótimo abrigo. De repente, uma senhora resolve passar mal. Era uma vizinha. Saí da frente para que ela entrasse esfregando o peito: - ai, eu sou infartada... estou passando mal... o locutor, com seu inseparável fone de ouvido disparava ordens: - aqui não cabe mais ninguém, dona...tira o pé daí... minha senhora, aqui não é lugar de morrer... morre mais pra lá...
Quem quase morreu foi ele. Um estampido ao lado da cabine fez todos se atirarem ao chão e o locutor gritar com um choque, pois o vi atirando o inseparável lá no meio das arquibancadas. Dizem que isso faz ficar surdo. Se é que ele já não era.
Resumindo a ópera, meu primeiro e último jogo de futebol, acompanhando uma equipe de rádio, não terminou. E nunca recomeçou. Depois da chuva, ali estava uma situação pós-apocalíptica. Era gente correndo, equipamentos estragados, um frio siberiano, empurra-empurra, pisoteadas, choro e ranger de dentes.
Não sei se esse foi o motivo que me afastou do jornalismo esportivo. Sei que não fui convidado para nenhuma outra jornada. Acho que eles pensavam que eu dava azar.
Anos depois voltei a um estádio.  1989, Maracanã, no meio de uma equipe de mais de duzentos colegas em plena convenção de vendas. Fomos ver Brasil e Chile. Sim, exatamente aquele que não terminou. Acabou por causa de um foguete jogado perto do Rojas, goleiro do Chile, que fingiu ter sido atingido. Sim, eu, como bom Forrest Gump, estava lá. Mais um jogo não terminado no meu currículo.
Só que não desisti. Fui ao Mineirão duas vezes para ver meu Cruzeiro perder. No Maracanã vi um Brasil e Colômbia, que de tão ruim me fez dormir.  No Palestra,  vi meu Flamengo perder duas vezes do Palmeiras. Acho que das vezes em que me meti a assistir um jogo ao vivo, o único dia feliz foi no Orlando Scarpelli, em Florianópolis, quando vi o Brasil fazer dez gols, sete válidos, em Trinidad Tobago.
Não dou mesmo muita sorte em estádios. A única coisa boa até hoje, de verdade, que aproveitei, foi o feijão tropeiro do Mineirão. Nem precisa saber que jogo está acontecendo, até porque meu time sempre perde. Tendo o feijão, está tudo certo.

Em tempo: em 2014, vou ver a Copa pela TV.

sábado, 11 de junho de 2011

Esse lugar é Bonito

Poucas vezes vi um lugar ter um nome tão a ver com ele mesmo. Bonito, em Mato Grosso do Sul, é um desses lugares. A foto é minha ou do meu filho, não sei mais. Conseguimos flagrar esse momento aí. O lugar é muito mais que Bonito, por isso sugiro um plebiscito à municipalidade para modificar o nome para Fabuloso e assim fazer mais justiça.

Verdade esse negócio de nome. Tem lugar que se chama Passa isso, Passa aquilo, Três isso, Três aquilo, Santo esse, Santo aquele, Rio de não sei o quê... cada nome! A gente vai, visita e vê que o nome do lugar não o identifica nem um pouco.

Com Bonito é diferente. Lá, só indo. A gente vai porque se chama Bonito e fica com vontade de voltar e de convencer os outros a irem também, porque, na verdade, é formidável, estupendo e mais um monte de nomes que não usamos mais, porém servem para mostrar o que os garotos de hoje chamam de "da hora" , "maneiro", sei lá mais o quê...